"A associação livre, a liberdade que se limita a manter a igualdade nos meios de produção e a equivalência nas trocas é a única forma possível de sociedade, a única justa, a única verdadeira" [Pierre-Joseph Proudhon].
À condição imperfeita que caracteriza a existência humana no estado de natureza, o que se impõe é a necessidade da instituição de um direito que, baseado no direito natural, seja assegurado pela coercibilidade que a instauração da sociedade política viabiliza, o que pressupõe que a caução social não guarda suficiência neste sentido que implica uma relação de dependência dos homens, no processo interindividual, no que concerne à razão e à consciência e antes à atividade que a encerra como tal nas fronteiras da sensação, a saber, a reflexão, convergindo o sistema filosófico-político de Locke para um racionalismo moral.
Nesta perspectiva, que encerra uma lei natural como base da ordem natural das coisas, o direito à vida, o direito à felicidade e o direito à liberdade não guardam o mesmo sentido entre os indivíduos que através do consentimento instituem a sociedade política, divergindo em função da condição de desigualdade que os caracteriza no âmbito da organização político-social que, segundo Locke, traz como fundamento ético-jurídico e econômico-político a propriedade, convergindo para uma determinada formação econômico-social e para um específico arcabouço de relações produtivas.
Estabelecendo o direito de propriedade através de um conceito que, além da terra, envolve a vida, a liberdade, o corpo, o trabalho, Locke institui uma sociedade política que coloca em jogo tudo o que não seria passível de troca e que, dessa forma, é relegado às fronteiras do regime de relações econômico-sociais ora instauradas, o que implica em um direito paradoxal, cujo conteúdo corresponde ao status dos indivíduos como agentes econômicos em um sistema jurídico-político que tende a distinguir “proprietários” e “trabalhadores”, detentores dos meios de produção e titulares da força de trabalho.
Se a propriedade se caracteriza como um instituto para o qual converge uma relação que, trazendo como eixo de mediação a posse, envolve uma transição que emerge através do trabalho, à condição de direito inalienável e objeto de proteção do Estado se lhe atribuído por Locke, Rousseau, se lhe contrapondo, a identifica como a raiz da corrupção humana. Dessa forma, Estabelecendo uma correspondência envolvendo liberdade natural e posse, e uma relação que se lhes opõe e implica “liberdade civil” e propriedade, a leitura rousseauniana circunscreve esta última ao Estado Civil, à medida que a sua instauração converge para a organização social, a cujo poder, a Vontade Geral, permanece sujeita, tornando-se passível de limitação em função de três condições que se lhes demanda a existência, a saber, a desocupação da terra, a utilização para fins de subsistência e a sua real e efetiva exploração neste sentido, o que assinala que, contrapondo-se à perspectiva lockeana, que defende a responsabilidade do Estado quanto a sua proteção, o que se impõe é o interesse comum, as necessidades da coletividade, enfim, que se sobrepõem aos interesses particulares.
Nesta perspectiva, se a propriedade privada, a divisão do trabalho e a alienação perfazem a sociedade injusta, instaurando uma desigualdade incompatível com o pressuposto da condição humana, a liberdade, à sociedade justa impõe-se a construção de uma forma de associação que possibilite a defesa e a proteção tanto da pessoa como dos bens de cada associado, segundo Rousseau, implicando também que o vínculo estabelecido entre o indivíduo e todos os demais nesta relação constitutiva da organização social seja capaz de conciliar a necessária obediência e a essencial liberdade em uma construção que demanda uma sujeição que não se circunscreva senão a si mesmo, conforme pressupõe a Vontade Geral como processo ético-jurídico de deliberação coletiva e condição para o exercício da soberania popular.